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Do Céu Caiu Uma Estrela (1946)

Do Céu Caiu Uma Estrela (1946)

O visionamento do filme Do Céu Caiu uma Estrela faz já parte da tradição de Natal, sendo o expoente máximo dos dramas sentimentais americanos. O estatuto de culto do filme começou quando, em 1974, os seus direitos de autor caíram no domínio público devido a um lapso burocrático e o filme começou a ser presença constante nas emissões de Natal das cadeias de televisão norte-americanas (e um pouco por esse mundo fora).

O filme teve origem no pequeno conto The Greatest Gift que Philip Van Doren Stern escreveu nos seus cartões de Natal e que Charles Koerner deu a conhecer a Capra como possível produção da recém criada Liberty Films. Capra acabara de regressar da guerra (onde realizou filmes para o exercito norte-americano) e encontrara uma Hollywood muito diferente, tendo fundado a Liberty Films, conjuntamente com William Wyler e George Stevens, como forma de manter o seu nome acima do título (um símbolo de estatuto).

Capra adorou o conto de Stern a ponto de dizer que era a história que tinha procurado toda a sua vida e encarregou Albert Hackett e Frances Goodrich de escrever o argumento. O realizador, que tinha o dom de contratar os actores certos, apenas via James Stewart a interpretar George Bailey e o argumento foi escrito com o actor em mente.

Para Stewart, Do Céu Caiu uma Estrela marcava também o regresso do actor a Hollywood após a guerra e a oportunidade de trabalhar com um realizador que tinha marcado a sua carreira. Ao contrário de Capra, que não mais voltaria a conseguir a popularidade de outrora, Stewart tornou-se mais popular do que nunca e o filme permitiu-lhe interpretar papeis mais negros e de moralidade dúbia, como foi o caso em Janela Indiscreta.

Para o papel de namorada de George Bailey, o realizador pretendia Jean Arthur, que tinha trabalhado ao lado de Stewart em dois filmes de Capra (Peço a Palavra e Não o Levarás Contigo), mas a actriz tinha outros compromissos e a escolha recaiu em Dona Reed. Como muitas vezes acontece, o acaso revela-se providente e, hoje, ninguém consegue imaginar Mary Bailey interpretada por outra actriz: as cenas do primeiro beijo entre o casal e a dança na piscina são excelentes exemplos da complementaridade do casal.

Na mesma linha, a escolha dos actores secundários é também perfeita: Lionel Barrymore (que também participara em Não o Levarás Contigo) é um excelente contra-ponto a George Bailey, Henry Travers é o simpático e inesquecível anjo, Frank Faylen e Wand Bond interpretam Ernie (o taxista) e Bert (o polícia) de tal forma que duas personagens da série infantil Sesame Street têm os seus nomes.

A rodagem do filme decorreu entre Abril e Agosto de 1946, segundo Capra, quatro meses “num orgasmo ininterrupto”. Após a rodagem, Capra considerou que Do Céu Caiu uma Estrela era o melhor filme que alguma vez realizara. Mais, o melhor filme que alguém realizara. Tecnicamente, o filme é impressionante, tendo sido necessário construir uma réplica de mais de 250 metros da principal rua da cidade, com 80 lojas e edifícios, 20 árvores de grande porte e a utilização de uma nova técnica para simular neve, onde foram gastas, entre outras, 3 mil toneladas de gelo e mais de 27 mil litros de químicos.

O filme estreou a 18 de Dezembro de 1946, tendo-se revelado um fracasso de bilheteira e a crítica mostrou-se dividida, havendo quem o considera-se demasiado sentimental e piegas. Não obstante, foi nomeado para a cinco óscares, entre eles melhor filme, melhor realizador e melhor actor principal, mas acabou por nada ganhar e mal conseguiu recuperar o seu custo em receitas de bilheteira.

Do Céu Caiu uma Estrela é um excelente exemplo do cinema sentimental de Frank Capra. A forma simples e eficaz como transmite a mensagem universal de como um homem comum pode transformar (para melhor, claro) a vida dos que o rodeiam é perfeita e o grande charme do filme. Talvez a altura em que o filme estreou (pós-guerra) tenham contribuído para o seu fracasso, mas o acaso (mais uma vez) veio fazer justiça e trazer reconhecimento a uma das mais emblemáticas produções do cinema americano.

Nota: devido ao facto de os seus direitos de autor terem caído no domínio público existe uma versão colorida do filme que a cadeia de televisão norte-americana NBC registou em 1994. Esta é uma má versão, que apenas prejudica o filme. No entanto, existem estações de televisão que preferem pagar para transmitir a horrível versão colorida do que transmitir a superior (e grátis) versão original.


It’s a Wonderful Life
RKO Radio Pictures, Liberty Films. EUA, 1946, 129m, drama. Realizador: Frank Capra. Argumento: Frances Goodrich, Albert Hackett, Jo Swerling e Frank Capra, baseado na história The Greatest Gift de Philip Van Doren Stern. Actores: James Stewart, Donna Reed, Lionel Barrymore, Thomas Mitchell, Henry Travers, Beulah Bondi, Frank Faylen, Ward Bond. Sinópse:Um anjo evita que um homem se suicide e mostra-lhe como a vida da pequena cidade onde vive seria sem ele.

The End