As histórias da história do Cinema

Pessoas

Charlie Chaplin na Essanay Film

Charlie Chaplin é um dos grandes artistas do século XX e sua longa carreira de mais de 70 anos de actividade e mais de 80 filmes realizados, produzidos e interpretados são reveladores de uma capacidade criadora excepcional e ímpar na história da Sétima Arte. Desta sua longa carreira, o período menos conhecido do actor é o que trabalhou na Essanay Films e onde “apenas” produziu 14 filmes, por vezes considerados obras menores. Embora não sejam realmente obras emblemáticas, são filmes reveladores de um importante período de aprendizagem e crescimento do artista.

Charlie Chaplin nasceu no meio de uma disfuncional família de artistas e cedo teve a necessidade de trabalhar para ganhar dinheiro. O palco surgiu naturalmente para Chaplin, que alcançou sucesso numa trupe de artistas. Como acontecia muitas vezes na época, o passo seguinte foi as imagens em movimento: uma nova indústria sedenta por caras e números novos, onde Chaplin descobriu o meio perfeito para se expressar, mantendo o controlo que sempre exigiu.

A entrada de Charlie Chaplin na nova indústria deu-se através da Keystone Studios onde tomou conhecimento da técnica necessária para contar uma história e onde começou a moldar a que viria a ser a sua personagem icónica: O Vagabundo. A adaptação ao novo meio foi tão natural que Chaplin rapidamente se tornou num sucesso e quando foi altura de renovar o seu contrato com a Keystone, as suas exigências salariais dispararam e o actor acabou por assinar um contrato milionário com a Essanay Films.

Chaplin chegou à Essanay em 1915 e ainda de forma anónima, uma vez que, à época, os actores de cinema eram apenas rostos e não tinham um nome e uma persona associada. No entanto, Chaplin era já considerado o homem mais divertido das imagens em movimento e a sua chegada a Chicago, sede da Essanay, criou grandes expectativas. No entanto, Chaplin apenas produziu o primeiro filme na cidade, já que as condições meteorológicas, em particular o vento pelo qual a cidade é conhecida, não eram as melhores para a produção cinematográfica. Assim, logo após terminar A Estreia de Charlot, Chaplin decidiu mudar-se para os novos estúdios da Essanay na Califórnia, que devido às suas excelentes condições climatéricas e cenário natural, se estava a tornar no grande centro cinematográfico americano.

As condições de trabalho que Chaplin disponha na Essanay eram únicas na industria e o facto de ter um estúdio exclusivo e de trabalhar em secretismo eram reflexo disso mesmo. Os seus filmes não tinham argumento, apenas existiam esboços e ideias, que Chaplin, ao seu próprio ritmo, ia desenvolvendo e melhorando. Muito embora este método de trabalho, os filmes de Chaplin revelam espontaneidade, mas este processo mais elaborado e ponderado fez com que Chaplin apenas produzisse 14 filmes ao longo do ano e meio em que esteve na Essanay, cerca de metade dos filmes que fez na Keystone. No entanto, esse período foi aproveitado para tornar os seus filmes mais sofisticados e com personagens mais completas. São nítidas as inovações que o artista introduziu nos seus filmes e as contribuições que deu para a evolução do género. Um dos conceitos que Chaplin mais desenvolveu, neste período, foi o de páthos (a empatia ou paixão criada pela representação artística), que se tornaria muito importante ao longo da sua carreira e cujo risco não passou despercebido, tendo o artista sido criticado por isso. O período de Chaplin na Essanay revelou-se, assim, importante para o artista, mas o contrário também é verdade, já que a empresa, hoje em dia, é mais recordada pelos filmes do actor do que pela restante produção.

A Essanay foi fundada em 1907 por George K. Spoor e Gilbert A. Anderson e o seu nome deriva da primeira letra do último nome dos dois fundadores. A empresa tinha sob contracto alguns actores conhecidos e populares, mas os seus filmes nunca saíram da mediania e a contratação de Chaplin foi realmente o ponto alto da existência da empresa. Os filmes de Chaplin tinham tudo o que os restantes filmes da Essanay não tinham e, por isso, eram os mais procurados pelos exibidores. Perante esta procura, a Essanay começou a exigir que, por cada filme de Chaplin comprado, os exibidores tinham de adquirir um outro filme do catálogo da empresa. Esta prática, contestada na época, tornou-se tão comum que se mantém nos dias de hoje. Os nomes da Essanay e de Chaplin juntos eram tão fortes e populares, que alguns exibidores recuperaram os filmes do actor na Keystone e rebaptizaram-nos de “Apresentações Essanay”.

Muito embora o sucesso, o ano e meio de Chaplin na Essanay foi um período de constante tensão entre o actor e os responsáveis da empresa: enquanto Chaplin queria evoluir e desenvolver novos conceitos cinematográficos, a Essanay via as “imagens em movimento” como uma fábrica, produzindo filmes em série. Aquando da renovação do contracto, Chaplin exigiu um salário de dez mil dólares por semana e não foi surpresa a resposta negativa da Essanay. Como consequência, Chaplin abandonou a empresa e assinou um contracto com a Mutual Film Corporation, onde viria a solidificar o seu sucesso. Por seu lado, a Essanay entraria numa fase difícil que levaria ao seu fim: para além de perder a sua grande estrela, foi processada, em conjunto com as restantes empresas que faziam parte da Motion Pictures Patents Company, por violar leis antimonopólio. Em 1918, a Essanay fechou as suas portas, sendo, hoje, recordada precisamente pelos filmes de Charlie Chaplin.

The End