As histórias da história do Cinema

Estúdios

RKO Radio Pictures

A RKO Radio Pictures foi criada em 1928 pela Radio Corporation of America (RCA), cujo sistema de som em película (Photophone) tinha sido preterido pelo da rival Western Electric (Vitaphone) pelos estúdios de Hollywood. Como resposta à Vitaphone, a RCA adquiriu a rede de salas de cinema Keith-Albee-Orpheum e a produtora Film Booking Office of America (FBO), criando a RKO com o objectivo de produzir apenas filmes sonoros.

Os primeiros anos da empresa, dominados pelos musicais e comédias cheias de diálogos, foram de algum sucesso, mas os realizadores que trabalhavam para o estúdio não estavam satisfeitos com as condições existentes e, em 1931, a RKO adquiriu a Pathé americana, cujos estúdios e rede de distribuição permitiu aumentar a capacidade de produção e distribuição da RKO. Nesse mesmo ano David O. Selznick torna-se o responsável pela produção do estúdio e cria uma unidade em que produtores independentes são contratados para produzir um determinado número de filmes, sem qualquer interferência do estúdio, mas em que este dividia os custos de produção em troca dos direitos de distribuição. A estratégia de Selznick passava também por realizar grandes estreias das suas maiores produções e, assim, foi responsável pela construção da maior sala de cinema do mundo, o Radio City Musical Hall, em Nova Iorque. A sala possibilitava a estreia das maiores produções do estúdio, rodeados de grande publicidade e notoriedade. Infelizmente a estratégia revelou-se bastante cara: quer para o estúdio, que fechou o ano de 1932 com 10 milhões de dólares de prejuízo, quer para Selznick, que foi despedido.

Merian C. Cooper, um antigo colaborador de Selznick, torna-se o novo responsável pela produção da RKO e o estúdio passa a apostar na produção de filmes de menor orçamento. No entanto, um dos primeiros filmes a sair do estúdio nesta altura é King Kong (realizado pelo próprio Cooper), que estreia no Radio City Music Hall rodeado de grande publicidade e torna-se um dos grandes sucessos do estúdio. Para além das suas próprias produções, a RKO distribuía ainda os filmes de Walt Disney (curtas e longas-metragens) e as produções de Samuel Goldwyn. Durante a década de 30, estão sob contracto do estúdio estrelas como Cary Grant, Irene Dunne, Douglas Fairbanks, Jr., Fred Astaire, Ginger Rogers, Katharine Hepburn, entre outros, e embora a RKO não tivesse os recursos financeiros dos restantes estúdios, os seus filmes eram conhecidos pelo seu estilo e desenho de produção.

No final da década de 1930 e já sob a orientação de George Schaefer, a RKO volta a apostar na qualidade e do estúdio saem filmes como As Duas Feras e O Mundo a Seus Pés, este considerado como o melhor filme de todos os tempos. Mas a política de filmes de prestigio não teve grande sucesso e, a partir de 1942 já sob o comando de Charles Korner, a RKO aposta em secções duplas e em filmes B. Após a morte de Korner, o seu sucessor, Dore Schary, reaviva algumas práticas de Selznick e volta a apostar em co-produções com produtores independentes, tais como: Do Céu Caiu uma Estrela, Os Melhores Anos das Nossas Vidas, Forte Apache, Os Dominadores, entre outros.

Do Céu Caiu Uma Estrela (1946)

Ao contrário dos restantes estúdios de Hollywood, em que cada um tinha um género porque era conhecido, a RKO não era sinónimo de nenhum género específico. No entanto, é possível identificar a marca do estúdio num conjunto de filmes que marcaram a história do cinema durante esta década. Reflexo dos filmes de baixo orçamento que o estúdio produziu durante a década de 40, o film noir tornou-se num importante marco da RKO e os actores que estavam sob seu contracto tornaram-se os mais conhecidos do género: Robert Mitchum, Jane Russell, Robert Ryan, Audrey Totter, George Raft, entre outros.

Em 1948, o milionário Howard Hughes adquire parte do capital da RKO por pouco menos de 9 milhões de dólares e o estúdio, ao contrário do que seria de esperar, entra num período conturbado: para além de despedir 2/3 dos empregados do estúdio, as psicoses de Hughes fazem parar a produção durante seis meses, enquanto o milionário investiga o passado político dos restantes empregados. Uma vez retomada a produção, Hughes interferia nas filmagens e ordenava a rodagem de novas cenas sempre que considerava que os actores, em particulares as mulheres, não sobressaíam ou se a mensagem anticomunista não era suficientemente explicita.

A ordem do tribunal norte-americano em obrigar os estúdios de Hollywood a vender as suas salas de cinema, afectou também a RKO, que viu a sua frágil situação financeira piorar. Para agravar a situação ainda mais, Hughes dava mais atenção aos seus interesses aeronáuticos do que ao estúdio (o milionário detinha fábricas de aviões e era dono da transportadora aérea TWA) e foi alvo de diversos processos judiciais por má gestão. Aborrecido com estes fait-divers, Hughes acabou por comprar a maioria das acções da RKO por 24 milhões de dólares e, em 1954, tornou-se na primeira pessoa a ser dona de uma das majors de Hollywood. Seis meses depois, Hughes vende inesperadamente a RKO à empresa de pneus General Tire and Rubber Company por 25 milhões de dólares, mantendo apenas os direitos sobre os filmes que produziu pessoalmente.

O interesse da General Tire era, não tanto nos estúdios, mas nos filmes da RKO, já que as estações de televisão, inclusive as da General Tire, necessitavam de conteúdos para a sua programação. Sabendo disso, a General Tire logo vendeu os direitos dos cerca de 700 filmes da RKO por 15 milhões de dólares, cujo preço revelava a importância deste tipo de conteúdo. Este negócio permitiu que grande parte dos filmes da RKO, incluindo clássicos como O Mundo a Seus Pés e Do Céu Caiu Uma Estrela, passasse regularmente na televisão e os filmes fossem redescobertos pelo público.

A General Tire ainda tentou gerir o estúdio, mas grande parte da produção resumia-se a remakes de sucessos anteriores ou filmes B. Anos de má gestão levaram realizadores e produtores a perderem confiança no estúdio e Walt Disney e Samuel Goldwyn acabaram por abandonar o estúdio. Perante este cenário, a General Tire decide fechar a RKO em Janeiro de 1957 e vender os estúdios à produtora de televisão Desilu Productions, que em 1967 viria a ser comprada pela Paramount Pictures e os transformou na Paramount Television. Com o fecho da produção, os filmes ainda por estrear da RKO foram distribuídos, entre 1957 e 1959, por diversos estúdios, entre eles a Warner Bros., a Metro-Goldwyn-Mayer e a Universal Pictures, mas sempre mantendo a indicação de que os direitos de autor pertenciam à RKO.

O nome do estúdio permaneceu durante os anos, já que a RKO General era a dominação da empresa subsidiária da General Tyres para os meios de comunicação e que detinha uma cadeia de rádios. Em 1989, a General Tyres foi comprada pela alemã Continental Tire, que vendeu a RKO General à empresária Dina Merrill e ao seu marido, o produtor Ted Hartley. Os novos donos, que detêm todos os direitos sobre os logótipos, marcas, argumentos, histórias, remakes e sequelas dos filmes da RKO Radio Pictures, ressuscitam a produtora, produzindo remakes de sucessos antigos e peças de teatro. Embora ainda hoje exista legalmente, a actual RKO Pictures quase não tem actividade e é uma sombra dos seus tempos áureos, mas a sua história é parte integrante da Sétima Arte.

The End